Sem querer, buscando velhos alfarrábios virtuais, encontrei uma pequena crônica que escrevi em 2002, e que não recordava. Um texto que suspendeu sua existência por alguns anos - nove para ser exato. Seria mais um dos muitos textos meus que se perdem, não apenas de mundo real, como de minhas lembranças, mas, com um clique do acaso, ei-lo aqui em meu monitor.
Escrevi o texto no dia que o Brasil se consagrou pentacampeão e é engraçado ver que depois de nove anos as coisas continuam iguais. Não lembrava do texto e mudaria muito de sua forma se o escrevesse hoje, por isso tive que lutar com o ímpeto de modificar toda sua estrutura e não manter o original.
HÁ UMA MANCHA
(Orlando Sérgio)
Os Guerreiros vão para a batalha. Debaixo de vaias eles partem para o desconhecido. Povos diferentes partem para a guerra e nossos guerreiros, mesmo vaiados por alguns, partem de cabeça erguida. A esperança existe, mas é pouca, pois alguns de nossos melhores guerreiros estão feridos.
Os ensinamentos de guerra não foram bem ensinados, falam uns. Eles não se conhecem, falam outros... e a estranha família parte para a guerra.
As primeiras batalhas são difíceis e os ferimentos expostos.
Os guerreiros voltam das primeiras batalhas vitoriosos, mas só as feridas são vistas. Os médicos de plantão do reino insistem em enviar seus remédios milagrosos para o campo de batalha, mas o Coronel Felipão, que também é pajé, diz que já está bem servido. Ele sabe que seu remédio faz efeito, mas é demorado. Deve ter sido dado à conta-gotas.
A cada batalha os ferimentos cicatrizam e desaparecem cada vez mais rápidos.
Chega, então, a grande batalha que decidirá a guerra: A batalha final.
Os Deuses do Olimpo vão para as nuvens mais baixas para ver de perto a batalha mais esperada de todas as guerras. Os dois exércitos que sobreviveram estão frente a frente no campo de batalha e um deles é o nosso.
Os soldados começam a guerrear e até os mal humorados do reino começam a ter esperança na vitória.
O grande prêmio desta guerra, que todos almejam sem se importar com os ferimentos, está reluzente sobre a pequena montanha de cristal.
A batalha continua e tiros são disparados de ambos os lados.
Com dois tiros certeiros, o soldado Ronaldo que - assim como outros guerreiros - foi promovido a Sargento, abate (com a ajuda do cabo Rivaldo) os últimos sobreviventes do exército inimigo.
A Guerra está ganha. A vitória é nossa.
Coronel Felipão suspira aliviado e recompensado. O povo e os soldados custam a acreditar. As dores dos ferimentos desaparecem por completo. E os soldados se tornam heróis.
Sobem na colina para apanhar o prêmio pelo qual colocaram suas vidas em jogo. Seguram o troféu e impõem, ao mundo e aos seus adversários, sua superioridade.
Mas há uma mancha...
Uma mancha que sempre espreitou pelo caminho dos nossos guerreiros...
A mancha, que sempre andava nas sombras, mostrou sua cara... e sobe a colina atrás dos heróis tentando confundir-se com eles... mas continua sendo uma mancha do reino.
Uma mancha que tenta ofuscar o brilho de nossas estrelas, de nosso exército iluminado.
Essa mancha tem cabelos brancos e tenta refletir a luz de nossos astros acreditando que tem luz própria...
Mas não tem luz própria e, como um buraco negro, tenta sugar tudo que está a sua volta, assim como costuma fazer no reino.
Os heróis voltam para o reino achando que todos os males foram derrotados.
Mas não se esqueçam, oh amados guerreiros, que uma nova guerra devemos travar.
Essa guerra é dentro do reino.
Essa guerra é da luz contra a escuridão.
A guerra do povo contra a sombra.
Contra a grande mancha.
Será que venceremos?